quinta-feira, 24 de março de 2022

Desprezando a presença da morte?

 

             


              Mais uma vez ela estava presente, ou melhor, ela sempre esteve. Por mais que não a enxerguemos, está rondando o ambiente. E, quando menos esperamos, aparece num último suspiro, acompanhada sempre de algumas indagações, medos, incertezas, sofrimentos, projetos inacabados e até mesmo alívios.Quando se recebe a notícia de que se está com uma doença terminal, se pensa logo que vai morrer. E, realmente, em algum momento vamos morrer... Só que não sabemos o momento.  Quando a morte é no “outro”, acabamos de alguma forma, morrendo um pouco. Apenas presenciamos, sabendo que em algum momento esta morte será no “eu”. 

               Ainda assim, continuamos a viver como se nunca fossemos morrer, adquirimos coisas, fazemos planos e até colecionamos objetos, sem pensar que em algum momento vamos nos desprender deles. Essa é a forma através da qual a sociedade enxerga a morte. Falar de morte ainda é um tabu. Falamos de sexo, de drogas, até de ufologia, mas escondemos, velamos, não enxergamos, negamos esse fenômeno chamado morte, sempre pulando este capítulo.  Sentir a presença da morte, em um ambiente do qual ela faz parte do contexto, é algo difícil de assimilar. Por mais que saibamos que a morte é uma certeza, não conseguimos aceitar a finitude como algo natural do desenvolvimento humano. Damos tanta importância para o nascer porém desprezamos o morrer. Todavia não podemos ver o nascer sem o morrer. Até o sol nasce e morre, e mais uma vez negamos o morrer, pois quando falamos no sol dizemos “o sol nasce e se põe” e não “o sol nasce e morre”. Medo, negação ou apenas uma forma de evitar falar na palavra morrer. 

                No livro “Totem e Tabu’, Sigmund Freud relata experiências de ancestrais, nas quais a morte era respeitada, sendo sempre obedecidos rituais e costumes, de acordo com os quais até os guerreiros da época faziam oferendas para os inimigos, que eles próprios haviam abatido nos combates. Podemos fazer um paralelo entre presente e passado, constatando que muita coisa mudou e ainda vai mudar. Através dos tempos a morte foi sendo banalizada e até desrespeitada. O morrer em casa, na companhia da família, foi sendo deixado para trás, não tendo mais o moribundo o direito de escolher onde morrer, passando a se tornar apenas um objeto valioso em qualquer CTI hospitalar. 

                Heidegger diz “que o homem deve estar em permanente vigília com relação aos fenômenos que se apresentam, e que afetam diretamente no transcorrer de sua cotidianidade. A morte deve ser enxergada como uma realidade de nossa vida.” A verdade é que com toda essa evolução em termos de apego as coisas materiais, nossa sociedade foi se distanciando dos valores reais e naturais. O homem atual encontra-se despreparado para enfrentar a morte, e vê o fenômeno como um duelo, e não como uma sequência natural do viver.

 

Marcelo Ávila Franco

 

sábado, 19 de março de 2022

Resgatando o passado, o velho e clássico disco de vinil

 

    


       

Geralmente quando falamos em cultura nos lembramos de quê? Livros, teatro, cinema, dança e claro discos de vinil. Apesar de estarmos vivendo o momento da era digital, o disco de vinil também conhecido como Long Play (LP) ou apenas vinil, segue firme e admirado por alguns fãs, fiéis ao tipo de som mais puro e nem tão límpido assim.

            O disco de vinil é uma mídia que foi desenvolvida em meados da década de quarenta, geralmente confeccionado na cor preta, apesar de existirem outras cores, tais como verde, amarelo e vermelho também. Ele é feito de material plástico (cloreto de polivinila ou PVC), nas usuais 78 RPM (rotações por minuto). O vinil é um material leve e delicado, que exige manuseio a ser feito segurando suas bordas.

            Os discos viraram peças raras nos dias atuais, e seu preço tornou-se nada convidativo. Os adeptos e colecionadores muitas vezes pagam o valor três ou quatro vezes mais caro, comparativamente ao formato em CD, mas o valor sentimental e sua preciosidade valem a pena. Alguns colecionadores dizem que uma das vantagens em relação ao CD, é relacionada a sua maior durabilidade, bastando que se armazene de forma adequada para que o disco permaneça em bom estado por  muitos anos. Mas não é só essa razão que fez o LP sobreviver através dos tempos, o prazer em cultivar um hábito raro, envolve vários outros, como o de escutar o clássico chiado, característica única do LP, a satisfação em sair à procura e garimpar preciosidades, sem contar a beleza das capas que são verdadeiras obras de arte. Alguns especialistas no assunto defendem a superioridade do LP com relação ao CD, dizem eles que a gravação digital acaba cortando frequências sonoras mais altas e baixas, eliminando ecos, harmonia, batidas graves, espacialidade do som e, principalmente, sua naturalidade.

            Infelizmente nem tudo é romance com esse tipo cultura, pois a diminuição das fábricas de LPs, fez com que eles ficassem cada vez mais escassos e raros, havendo hoje no Brasil apenas um ou dois fabricantes de discos de vinil. Com isso o preço acabou ficando bem “salgado” e para ter uma raridade dessas em casa, é necessário se desapegar muito do seu dinheiro. Dadas a raridade e valorização peculiares a estes produtos, eles hoje são considerados peças raras e quem tem algum exemplar em sua residência possui uma verdadeira peça de coleção. Peço desculpas por minha ousadia, mas podemos chamá-los de “quase Picasso”, principalmente com relação aos preços de mercado.

            Sabemos que a música é uma forma de arte que encanta a todos, sendo difícil encontrar quem não goste de música. Segundo historiadores, a música era usada na antiguidade para fazer celebrações, invocação de deuses e até matrimônios. Para os mais novos, que não sabem o que é um verdadeiro LP, há de se fazer o registro de que vale a pena procurar em algum sebo e testar sensorialmente a experiência de escutar um LP. Mais que reviver a história da produção musical de uma época, ouvir um LP constitui-se na experiência mais original e fiel de contemplação da música, seja qual for o estilo, do clássico e erudito ao rock ou samba.

Marcelo Á. Franco

domingo, 13 de março de 2022

Ensaios sobre Morte e Tabu


 

“Quem não sabe o que é a vida, como saberá o que é a morte?” essa célebre frase é de Confúcio, pensador e filósofo chinês. Mas o que sabemos sobre ela? O que se pensa quando se fala em morte? Ou mesmo na palavra vida? Ainda hoje há rumores de que o homem não foi até a lua, segundo Love Kraft os gatos é que iam até a lua, fazendo viagens cósmicas. Existem muitos mistérios ainda não desvendados que assustam o homem, mas existe um que assusta e fascina ao mesmo tempo. A morte, esse fenômeno que nos rodeia desde o início dos tempos, e que vai nos acompanhar pela eternidade.

A palavra morte vem do latim mors, umas das únicas certezas que se tem na vida é a morte. Sabemos que vamos morrer, mas mesmo assim, fazemos de tudo para retardar ou mesmo driblar a finitude. É engraçado, podemos marcar a hora de um nascimento, mas não de uma morte, ela, a “morte” é quem decide o horário do desenlace, salvo exemplos de assassinatos ou homicídios que se enquadram em outro tipo de questão. Os médicos podem até dizer que um indivíduo tem alguns meses de vida devido a uma doença terminal, mas não sabem precisar exatamente a data e a hora do encontro com a morte. Esse é um fenômeno digno de mais respeito do que o atualmente a ele dispensado, mas devido à ignorância da humanidade, o respeito pela morte foi levado ao segundo plano, fazendo lembrar um dos livros de Sigmund Freud “Totem e tabu”, que revela algumas das diversas abordagens conceituais existentes sobre a morte, derivadas da diversidade histórica, cultural e religiosa de cada sociedade em seu tempo. Numa das passagens, descreve que os guerreiros quando abatiam um adversário faziam oferendas em respeito à morte do adversário, pois era forte a crença no sentido de que se não fizessem um culto a morte seriam amaldiçoados. Claro que cada época tem seus rituais e tradições, mas atualmente não esboçamos o devido respeito pelo fim da vida, fato que, aliás, provavelmente é consequência da desvalorização da própria vida.

O filósofo alemão Martin Heidegger retrata em seu livro “Ser e tempo”, as condições da morte, fala que não devemos temer a morte, pois “se eu estou aqui, a morte não está presente, e se ela está aqui eu não estarei presente, por isso ela está onde não estou então por que temê-la?” Mas não é tão fácil aceitá-la, principalmente se estivermos envolvidos com a situação, pois ao se perder um amigo ou um ente querido a finitude e a certeza da futura ausência física permanente não é nada fácil. Por isso Heidegger coloca que o homem precisa estar permanentemente em vigília, com relação aos fenômenos que se apresentam, e que de alguma forma o afetam diretamente no seguimento de sua cotidianidade.

O que tem do outro lado? Nos tempos atuais não pensamos nisso, não questionamos, nem nos preocupamos, mas e quando chegar a nossa hora? Vamos passar pelos cinco estágios da morte, negação, raiva, barganha, depressão e aceitação, mas não necessariamente nessa ordem cada um vai ter a sua ordem nesse processo. E aí? Será fácil dizer a todos: “calma está tudo bem! Chegou a minha hora! Estou pronto!”, claro que não, sempre vamos nos apegar no mínimo sopro de vida, sempre teremos aquele projeto inacabado, aquele lugar que ainda não visitamos, a louça que ainda não lavei, imagina como vou deixar a louça suja para alguém lavar! Nessa hora vamos dar as desculpas mais estapafúrdias para ficar só mais um pouquinho, pois o ser humano além de apegado às pessoas, também tem apego a coisas, é apegado à vida. Mas por que não dar o devido valor antes de chegar essa hora? Por que deixamos tudo para a última hora? Então se ainda há tempo, dê um abraço em quem está ao seu lado, peça desculpas a alguém que você magoou, acorde agradecendo por você ter mais um dia de vida, agradeça apenas por estar respirando, largue o celular quando estiver em uma parada de ônibus e olhe as árvores, os pássaros, cumprimente um desconhecido, enfim: apenas viva como se fosse sempre o último dia de sua vida, pois certo é que tudo terá mais sentido num simples, autêntico e imediato viver, sem postergações, desculpas e indiferenças que ao final farão toda a diferença.

Marcelo Ávila Franco

Haicais em Cidreira

HAICAIS VeJo senTido no Meu desaPreÇo, Saudades No meU deSapeGo, Apego nO meU reCoMeçO. aManheCeu Em maiS Um diA. Olhos CanSados aPós noiTe ...