sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

No fim, podemos ter vários fins


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Sim, eu sei, claro que sei. Qualquer pessoa que der sequência à leitura deste texto vai se questionar, talvez até mesmo me xingar de todas as formas possíveis. E vou compreender totalmente mesmo as reações mais expressivas, mas preciso seguir falando e discutindo sobre esse tema. A fim de facilitar esta breve abordagem, não citarei como tema destas linhas a tal palavra proibida que categoriza o assunto como tabu no âmbito social. Assim, romantizando um pouco a fim de tornar a leitura mais leve, “light”, adotarei o termo finitude humana. Um dos únicos tabus que persistem em atravessar os tempos, e persiste como algo que afronta a vida das pessoas, um fenômeno dito como negativo, sombrio, funesto, sinistro, trágico, e qualquer outro tipo de adjetivo que possamos relacionar para algo visto como inegavelmente ruim. Mas a morte tem outros sentidos que de certa forma a sociedade nega, talvez para perpetuar o véu que encobre e torna misterioso o verdadeiro sentido de nossas vidas. Falar (ou escrever) sobre finitude implica intrinsecamente abordar a vida, o transcorrer do tempo de vida e as motivações que permitimos que nos impulsionem rumo ao seu esgotamento. Esta correlação é tão íntima que todos os aspectos relacionados ao tempo de vida como idade, envelhecimento, legado dos falecidos antepassados acabam por serem evitados ou tratados com mínima ênfase, dada a influência do tabu existente que relaciona o conceito de finitude apenas a aspectos extremamente ruins. Aliás, sendo as redes sociais reflexo dos valores que são exaltados, facilmente é possível compreender o que move a vida atualmente, quais as reais necessidades e excessos da maior parte da sociedade em que estamos inseridos. Ao exalar muito narcisismo, egoísmo e falta de EMPATIA, entre outros tantos maus valores (e alguns poucos genuinamente bons, é verdade!), percebe-se quão preocupadas em "parecer" estão as pessoas, enquanto, salvo melhor juízo, deveríamos estar preocupados em "ser", diante do cronômetro que nos impedirá a continuidade de existência, em um dia e hora qualquer. Parecer é imagem, embalagem, não permite que se transmita conteúdo de significado associado a bom valor. É apenas quando os bons valores que emolduramos diariamente estão contidos em nossa essência que criamos bom conteúdo, de fato. Parecer está relacionado ao outro, não a si mesmo e por si só já denota o quanto a maior parte de nossa sociedade não está preocupada em conhecer e entender a si mesma e seus fenômenos.

A morte é um fenômeno sobre o qual não temos controle, não dominamos, faz parte do desconhecido, do obscuro, do duvidoso, do contestável, etc. Carregamos esse temor pela morte, pura e unicamente por sua negação que a associa a significados ruins e a perpetua como tabu, dificultando a aceitação do tema em nosso quotidiano. As perguntas sem respostas são inúmeras, e uma delas é “o que tem lá do outro lado?” ou “o que vem depois?”. Toda essa incerteza nos causa angústia e consequentemente medo, que é um sentimento natural frente a algo desconhecido ou mesmo indomável. 

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Por ser um momento singular e intransferível não vamos vivenciar esse fenômeno mais de uma vez, e mesmo assim ele pode acontecer de inúmeras maneiras, desde um simples dormir e não acordar, passando por um escorregão no meio fio que faz bater a cabeça num paralelepípedo, até um acidente de automóvel. Não sabemos quando e nem como realmente vai acontecer e é isso que nos deixa intrigados, curiosos e com medo. Não é por acaso que vários filmes e seriados de televisão abordam o tema do ser imortal, esse desejo ou mesmo fascínio de viver eternamente ronda a mente humana. Pois, se pararmos para pensar, a morte nos ronda desde que nascemos, e rechaçamos essa possibilidade em nossas vidas, evitamos falar sobre ela até mesmo com a desculpa de que se tocarmos no assunto, ela aparecerá, e com isso mantemos firme o tabu com relação à morte. Mas estamos caminhando em direção à morte desde que nascemos. Martin Heidegger discute isso de forma brilhante no livro “Ser e tempo”.

Mas por outro lado, se constantemente de forma consciente e incessante pensássemos na morte, não teríamos a mínima condição de realizarmos nossas tarefas diárias, o viver seria prejudicado, pois ficaríamos neuróticos de tanto pensar em como seria esse encontro e não faríamos mais nada com medo de que o fenômeno pudesse acontecer a qualquer momento. Mas de maneira inconsciente ela estará sempre presente e essa necessidade de perpetuar a vida, é expressa de várias maneiras, demonstrando assim o medo que a morte nos provoca. 

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Não quero me estender neste pequeno texto, mas lembro que quando nos deparamos com a realidade de que um dia não vamos mais existir, passamos por crises pessoais e é justamente nestes momentos que começamos a pensar no sentido de nossas vidas. E qual meu propósito em postar um texto como esse em pleno fim de ano, um momento de muitas festas e alegrias, onde “parece” que todos estão “oceanicamente” felizes ? Apenas lembrar que somos finitos, que podemos comemorar o fim de ano tranquilamente, mas de forma comedida, não cometendo excessos e muito menos imprudências, que, mesmo que cometidas a qualquer (e por um breve) momento, podem deixar marcas para o resto de nossas vidas.


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Desejo uma ótima virada de ano a todos e que 2024 possa ser de muita paz e harmonia. E que possamos ver guerras e outras consequencias catastróficas apenas nos filmes de ação, de maneira a conscientizar nossa sociedade acerca dos valores que nos conduzem e da monstruosidade de nossas escolhas que constroem nossa reputação e legado. 

Marcelo Franco


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terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Entre nuvens

 

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Entre nUvenS,

E o VenTo,

MeU silÊnciO.

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Me peRdi no paSsadO,

EsqueCi mEu presEntE,

OnDe estarÁ meu FutuRo?

%

O pássAro fuGiu da fOto,

MaS o CÉU ainDa está lá...

Azul e líMpidO.

&

EntRe o rÚstico

Ao ÍntimO,

do reFúgio

Ao iNtríNseco!



Marcelo Franco


                                        Fonte 1: https://br.pinterest.com/pin/5418462043159850/


terça-feira, 12 de dezembro de 2023

Simbologia da morte, o homem e sua visão da finitude

                                                                                                Imagem 1


Ao longo dos tempos as representações da morte e ao redor do mundo são inúmeras, a imagem da caveira de certa forma se configurou em um símbolo da morte, cuja associação é praticamente instantânea e universal. Podemos melhor entender e dimensionar a relevância das representações no contexto social ao constatarmos que uma mesma imagem ou figura origina distintos significados subjetivos, tendo em vista as diversidades sociais e culturais nas quais estamos inseridos. 

As várias resistências que emergem instantaneamente (quase como um reflexo) diante de um símbolo associado à morte traduzem e mantém o fenômeno como um tabu, estando embasadas no mitológico, no religioso, no simbólico, no abstrato, sinteticamente, na questão subjetiva do ser humano. As representações da morte durante muito tempo se mantêm consolidadas por questões espirituais, religiosas e místicas, através da defesa inconteste que visa a manutenção de preceitos e rituais que enaltecem e perpetuam a simbologia. Mas além destes aspectos, a representação da morte se fez presente com o passar dos anos também através da expressão artística, podendo sua manifestação ser observada em alegorias, construções, obras de arte, etc. Atualmente podemos notar que a expressão da morte permeia nosso cotidiano e encontra-se visível através de vários tipos de representações, manifestamente observáveis em diversas áreas. Até hoje ainda podemos apontar que, a sociedade conseguiu assimilar o propósito do viver, mas ainda tem dificuldades de entender o morrer. De certo modo, ainda interpretamos a morte como uma afronta a vida, algo contraditório a vida, um não viver. Mas por incrível que pareça, a morte tem seu significado positivo, pois ela vai se fazer presente para acabar com a dor do ser, do moribundo, do paciente terminal, a dor que a própria ciência não controla mais.

 Discutir sobre as representações da morte vai nos trazer várias indagações, pois dependendo do local ou região, a representação poderá traduzir-se em um ou outro tipo de significado, e isso deve ser respeitado por quem observa externamente, uma vez que não partilham necessariamente dos mesmos fundamentos sociais desta interpretação exposta. A diversificação e a possibilidade de enxergarmos a morte de maneiras múltiplas nos mostram que a morte não é um tema fácil de ser abordado e discutido. Pode-se até mesmo indagar o gênero do substantivo: seria morte uma palavra (no caso substantivo) com denotação de gênero masculina ou feminina? Esta é uma resposta que vai depender da representação que ela traz individualmente para cada pessoa e da cultura que ela está inserida. No caso adotaremos o tratamento feminino do termo, predominante em nossa sociedade. Fato é que independentemente do aspecto sócio-histórico-cultural envolvido, a representação da morte é ampla e frequente, havendo inclusive aspectos em comum observados ao longo dos tempos.


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Assim como predominante a sua denotação feminina, podemos também afirmar como característica praticamente universal o fato de a morte manter-se atrelada a um ritual, seja qual for o tempo ou espaço. Verificada a ocorrência do fenômeno, invariavelmente tem início um rito que envolve tanto a pessoa que está morrendo quanto parentes e amigos próximos (às vezes até desconhecidos). Podemos dizer que, a morte é uma verdadeira cerimônia pública e organizada, onde o próprio individuou que morreu organiza indiretamente de certa maneira esse ritual, que ainda persiste em ser um tabu até os dias de hoje.

Como percebe-se, apesar de não poder ser definida através de uma simbologia única e universal, a morte encontra-se representada por meio de distintas formas de manifestações sociais, artísticas e culturais. Encontramos a sua representação presente em edificações, ruas, filmes, teatros, cinemas, músicas, livros, esculturas, pinturas e até mesmo em histórias em quadrinhos.

Marcelo Franco



Imagem 1: https://br.pinterest.com/pin/3237030976072671/
Imagem 2: https://br.pinterest.com/pin/59039445098133443/  Desenho de Pawel Kuczynski

Haicais em Cidreira

HAICAIS VeJo senTido no Meu desaPreÇo, Saudades No meU deSapeGo, Apego nO meU reCoMeçO. aManheCeu Em maiS Um diA. Olhos CanSados aPós noiTe ...