terça-feira, 12 de março de 2024

O que leva um pesquisador a investigar o fenômeno da morte?

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O que leva um pesquisador a investigar o fenômeno da morte? Essa é uma pergunta que me faço muitas vezes, pois cada vez que falo sobre minha pesquisa as pessoas perguntam: “Por que?” Sei que é um assunto complicado e cheio de tabus, mas me pergunto: por que não pesquisar? Vivemos em uma sociedade marcada pelo apego a coisas materiais, e que parece ter deixado de lado lembrar que somos seres finitos. Frente a esta situação verifiquei em vários momentos que existe um despreparo de enfrentamento quando esse momento chega. E aqui me refiro tanto ao despreparo da pessoa que enfrenta o fenômeno, pois todos nós vamos passar por esta etapa um dia, quanto (e principalmente) ao despreparo dos profissionais que lidam com o momento da morte. Sobretudo das pessoas que trabalham em hospitais, asilos e outros locais destinados a cuidar de pessoas idosas e/ou enfermas. A forma como as pessoas compreendem a morte é muito singular, depende muito de seu entendimento e o modo como as pessoas ao longo de sua vida lhe fizeram entender a finitude. Desde cedo as pessoas vão ter contato com as perdas, seja de um ente querido ou de um animal de estimação, mas a realidade desta perda vai ter sentido a partir da adolescência, época a partir da qual o indivíduo começa a entender o que realmente é a morte. E, desde então, evidenciamos que este fenômeno é alvo de adiamento ou repulsa, que é a única certeza que temos mas que é carregada de circunstâncias incertas quanto ao seu antes, durante e depois. Se inicia já diante dos primeiros contatos com a morte a repulsa ou negação acerca da ideia representada pelo fenômeno que transforma presença em ausência.

A consciência da morte não é algo inato, e sim produto de uma consciência que capta o real. É “por experiência”, como diz Voltaire, que o homem sabe que há de morrer. A morte humana é um conhecimento do indivíduo (MORIN,1997, p. 61).

  

A possibilidade de melhor se entender e por isso aceitar a finitude comumente se verifica na fase da velhice, quando entendemos que esta é a última etapa do ciclo de desenvolvimento humano. Mesmo assim, a cultura em que vivemos nos força de alguma forma a negar que em algum momento podemos não estar mais presentes neste plano, e a vida cada vez mais atribulada e cheia de imediatismos muitas vezes não nos permite tempo para reflexões mais abstratas e sobre eventos futuros como a morte.

Muitas vezes ao longo da vida vamos presenciar situações nas quais inúmeras desculpas serão utilizadas para adiar falar sobre o assunto, e mesmo quando tivermos a possibilidade de discutir o tema, muitas vezes seremos induzidos a negar e adiar, como se fosse um assunto proibido. Não podemos deixar de lembrar que o ser humano se diferencia dos outros animais por ser o único a ter consciência sobre a finitude, tendo a real representação do que é de fato a morte.

Marcelo Franco

* MORIN, E. (1997). O homem e a morte. Rio de Janeiro (RJ): Imago.


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